Tudo o que eu escrever aqui não é uma verdade absoluta e é apenas a minha opinião e experiência condensadas em poucas palavras.
A não ser, é claro, que você queira que elas sejam verdade. Nesse caso, eu sou o detentor de todas as verdades absolutas da realidade. Essa página é dedicada à análises mais específicas de jogos, mecânicas ou gêneros de jogo. Ou qualquer coisa que me der vontade de analisar.

Existem muito jogos que conseguem criar histórias magníficas. Existem muitos jogos que possuem um gameplay fenomenal. Alguns conseguem os dois, outros, um ou outro. Quando eu falo sobre RPGs eletrônicos de computador, principalmente os clássicos - Fallout, Planescape: Torment, Knights of the Old Republic - ou até mesmo os renascentistas - Disco Elysium, a trilogia Shadowrun, Pillars of Eternity - eu coloco muito mais ênfase na importância da narrativa do jogo do que das mecânicas de jogo. E até certo ponto, eu realmente não me importo que o combate de Planescape: Torment é ruim e muitas vezes supérfluo. Que todas as mecânicas de jogo de Disco Elysium envolvem clicar em opções de texto. Que a administração de itens em Fallout é horrível. Ok esse último é altamente irritante, mas não afeta a minha crítica sobre o jogo.

Por quê?

Eu acredito que jogos devem possuir uma especialização. Claro, um jogo pode possuir a especialização de "Fazer tudo", mas ele vai acabar sendo pau pra toda obra, e não vai ser bom em nenhuma área em particular. The Elder Scrolls por exemplo. É uma franquia fenomenal exatamente nisso: Fazer de tudo um pouco. Criar um mundo vasto e permitir que o jogador viva nele. Mas sejamos francos: Nenhum TES tem um combate tão bolado quanto Dark Souls. Uma jornada interna e filosófica como em Disco Elysium. Ou quebra-cabeças de dobrar a mente como em Portal. Mas o que eles possuem é um equilíbrio desses componentes de maneira que nenhum deles falta em excesso a ponto de frustrar o jogador(Até recentemente pelo menos). Por outro lado, existem os jogos que são extremamente bons em uma única coisa, e medíocres ou ruins em todo o resto. E eu digo isso com todo o respeito. O exemplo mais extremo disso é Planescape: Torment. É um dos meus jogos favoritos de todos os tempos. E de maneira alguma é um jogo chato ou frustrante, se você gosta de leitura. E esse é um dos pontos. Apesar da navegação de mapa simples, o combate meia-boca e o estilo de arte datado, ele mantém o seu interesse puramente pelo poder da sua escrita. Se ela possuísse o mesmo nível de simplicidade dos outros componentes, PS:T seria completamente esquecível.

Sim, ser um jogo extremamente especializado causa problemas. Não vai ser um jogo acessível e vai acabar pegando em um público muito específico. Mas isso cria uma experiência mais focada e concisa, e certamente mais memorável - Para o seu público.

E isso descreve os RPGs ocidentais para mim. Jogos especializados em contar uma narrativa em que jogador faz parte dela. As histórias únicas que eu posso fazer parte mais do que compensam pelos problemas evidentes em outras partes do jogo. Não estou dizendo que não é possível melhorar. O renascimento de RPGs em meados de 2014 prova que esse estilo de especialização pode ser refinado para construir excelentes histórias sem as partes irritantes que assombram os jogos mais antigos, é certamente isso que eu quero ver no futuro dos RPGs eletrônicos.

Imagine o seguinte:

"Arthan é um paladino que busca proteger os fracos e defender a justiça."

Chato. Padrão. É o equivalente a pedir um X-Burguer. Agora, vamos colocar um "MAS" nessa história:

"Arthan é um paladino que busca proteger os fracos e defender a justiça, MAS apenas devido a um juramento que ele fez ao seu mentor, antes de sua morte. Na realidade, o paladino é impaciente com aqueles que ele deveriaproteger, e discorda da maneira que o sistema de justiça de seu reino funciona."

Isso é muito mais interessante. É um hamburguer mais encorpado, com mais possibilidades. O arquétipo clássico de paladino da justiça e defensor dos fracos ainda está ali, mas esse porém faz que o personagem tenha uma dinâmica completamente diferente consigo mesmo. Uma reviravolta, mesmo que não seja apresentada como uma supresa, é essencial para uma história cativante, seja um conto épico ou a biografia de um personagem. Apresentar um mundo, um conceito, ou um personagem sem uma coisinha a mais não permite que eles sejam interessantes para quem está consumindo a história: São coisas que já foram feitas milhares de vezes. O que torna uma história ou um personagem únicos é essa reviravolta, esse defeito que muda o jeito que eles interagem com os seus arquétipos, esse "mas".

Vamos ver um exemplo que já foi aplicado, ainda utilizando a ideia de defensor dos fracos:

"Raiden é um ciborgue que busca defender os fracos dos fortes que abusam de seu poder, MAS, devido ao seu passado como um soldado durante a sua infância, ele possui tendências homicidas que vão além do necessário para 'proteger os fracos'."

Isso automaticamente cria um conflito interno no personagem. Agora, ele questiona a sua própria moralidade, sem saber se ele luta para defender os fracos, ou porque ele tem sede de sangue. Voltando para o exemplo de Arthan: Ele defende os fracos e a justiça por respeito e confiança em seu falecido mentor, mas apenas por isso. Caso ele descubra algo que abale a sua confiança no seu mentor, ele provavelmente irá mudar. A fundação e direção de uma história se escrevem sozinhas assim. A partir daí, é só seguir construindo a estrada.

MAS

Claro, nem tudo em uma história precisa ter uma reviravolta ou ser diferente. Personagens que não são o foco podem (e provavelmente devem) ser mais planos, para não tirar os holofotes de quem importa. As vezes o próprio mundo não precisa ser interessante se a história não precisar. Mas é tudo uma questão de equilíbrio: De algum jeito quem está contando a história tem que compensar nas coisas que faltam.

Agora vá jogar Metal Gear Rising logo de uma vez.